segunda-feira, 12 de maio de 2014

Saudades da Rainha




Simpatizo com quase tudo que venha da Inglaterra pelo simples fato de eu ter morado lá um tempo e esse tempo ter sido o melhor tempo da minha vida. Não tem um dia sequer que eu não sinta saudades da terra da rainha, de cada mínima experiência sensorial e até da pessoa que eu era lá (você nunca é a mesma pessoa).

Não gosto da ideia de um xeique árabe ou de um bilionário russo serem donos de dois dos principais times da Premier League. Mas também não gosto da máfia italiana, da máfia espanhola, da Unimed mantendo o Fluminense, da CBF administrando o futebol brasileiro, das licitações duvidosas para estádios e não gosto do bacana e popular Carnaval da Sapucaí - "o maior show da Terra" - ser controlado pelo jogo do bicho, ou seja, pelo tráfico de drogas do Rio de Janeiro. Assim como não gosto da Coca-Cola, mas há poucas coisas melhores para minhas ressacas. Menos ainda da exploração infantil em minas de nióbio na África para fabricar nossos inseparáveis smartphones. Infelizmente, o sistema é podre em princípio e já desisti de lutar contra ele há tempos. 

Voltando ao futebol: aos únicos que realmente importa ter o time controlado por um xeique - os torcedores do Manchester City - a coisa não está assim tão desconfortável, tanto que ontem havia faixas em homenagem a Mansour bin Zayed Al Nahyan, o homem que possibilitou o segundo título Inglês do clube em três anos.

Torci para o Liverpool por pura afinidade, mas é justíssimo que o City seja o campeão, pois é mais time, venceu mais, teve o melhor ataque, a segunda melhor defesa e tem aquele que é provavelmente o melhor meio campista da atualidade, o marfinense Yaya Touré.

Assisti o Fla-Flu horas depois do desfecho da Premier League e tive vontade de me dar um tiro, sobretudo por torcer pelo Flamengo. Sempre repudiei a adoração exagerada aos times e campeonatos europeus, mas preciso admitir que tenho acompanhado o Brasileiro por puro fanatismo e que vinha acompanhando o Campeonato Inglês porque gosto de futebol. Futebol mesmo. É como se você fosse obrigado pelo médico a só comer jiló, mas em um ou dois dias da semana você pode dar uma escapada e comer o que realmente é saboroso e se espera de uma refeição.

Estádios lotados em todos os jogos de absolutamente todas as rodadas; gramado impecável, times competitivos e equilibrados - mesmo os mais fracos -, o que resulta num campeonato disputado ponto a ponto até os últimos minutos da última rodada. No fim, para coroar, uma invasão de gramado clássica (veja aqui), com torcedores correndo para o meio do campo com copos de cerveja para dividir com seus ídolos e sinalizadores para colorir a festa.

Era o Campeonato Inglês das "novas arenas", do "público europeu" (uma das maiores bobagens que já escutei), do dinheiro de estrangeiros bilionários, mas era o melhor campeonato do mundo terminando em clima de Libertadores nos anos 80/90.

E a gente aqui no Brasil, para variar, fica como os otários, aqueles do 'complexo de vira-latas' do Nelson Rodrigues. Atrasados, revirando lixo, tentando enfiar o modelo dos outros no nosso e quebrando a cara, pois eles nunca se encaixam. Estádios vazios, ingressos caros para jogos sofríveis; um calendário lamentável com horários ainda mais lamentáveis. Dois ou três times que se salvam um pouquinho - justamente os que têm algum talento no meio de campo - e o resto todo brigaria para não cair mesmo diante do Hull City, Fulham e companhia, que são infinitamente mais organizados que o Flamengo - e longe de ser só o Flamengo - que vi ontem em campo.

Saudades da Rainha.



Por Roberto Passeri.























Nenhum comentário:

Postar um comentário