quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Fagulha no palheiro

Uma hora algo queima. Não de repente. Vai fritando aos poucos.

Pode ser uma frustração, um desejo que não se realizou. E pode ser defeito do sistema. Um alimentando o outro. Abrasando.

Por exemplo: quer ser artilheiro, craque com a dez, armador clássico, lançador, dono de arrancadas e dribles, passes de sinuca.

Desde pequeno tem talento para assumir o comando do ataque, o controle do meio-campo. O destino que carrega no nome.

Mas ninguém reconhece. No par-ou-ímpar, mais novo, vai pra zaga. Na peneira, tímido, vai pra zaga. No juvenil, sem lugar no meio e na frente, vai pra zaga.

E agrada. Claro, joga melhor que os zagueiros. Muito melhor.

Nunca mais sai de lá. Desarma. Marca. Tira a bola e passa pra outro brilhar, pro armador, pro meia, pro atacante, pro craque, pro artilheiro.

Nada de lançar, driblar, encantar. Só combate, cerca, impede as melhores jogadas.

Desfaz o que sempre quis fazer.

O reverso do seu sonho.

Nasceu pra enfrentar o mar – mas é faroleiro.

Zagueiro. E dos melhores. Titular, campeão, seleção, Europa.

Casa, carro, dinheiro, conforto.

Mas lá dentro um chip vai fritando.

Esquentando.

Acaba pegando fogo.


LUIZ GUILHERME PIVA (blog do Juca Kfouri)


Por Beto Passeri.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Só quem ouviu 'Aroud the World' de perto


De longe, na comodidade do sofá, tudo parece mais leve. Muito mais fácil, basta pressionar o botão do controle remoto e pronto. Outra realidade começa e deixa para trás todas as experiências sensoriais que o canal passado trazia. Assim faz a maior parte da população mundial, privada por condições econômicas, sociais, políticas, físicas ou, simplesmente, devido a epidemia de preguiça que surge da televisão. Para essas pessoas, a vida é como uma paisagem.

Entretanto, do outro lado da lente, estão os que realmente vivenciam aquele mundo. Que sentem, pelo tato, todos os aspectos trazidos por aquele universo. Diferentemente dos espectadores, os agentes são, de certa forma, mão-de-obra e matéria-prima da História. Eles entendem verdadeiramente as emoções que envolvem os fatos. Eles são parte da alma do momento.

Os Profetas de chinelos felpudos tinham convicções irredutíveis sobre o Rock in Rio. Eles acreditavam que se tratava de uma imitação barata dos eventos originais. Um festival que só trazia uma marca forte. Os grandes analistas de poltrona, de longe, foram enfáticos: shows fracos serão a tônica do evento que retorna ao Rio de Janeiro após um período de dez anos. Distantes do coração pulsante da música que ia contagiar a cidade, eles viam toda a repercussão como simples efeito publicitário.

A análise acomodada acontece em diversos tipos de espetáculo. Já faz algum tempo que o hábito de realizar a narração em um ambiente outro que não o Estádio se consolidou no Brasil. O locutor, enquadrado pelas limitações que a imagem que as câmeras transmitem, fica engessado, distante da atmosfera vivida pelos torcedores durante a partida. Cada vez mais monótonas, as transmissões se transformam em apenas mais uma peça do mosaico televisivo, da passagem incessante de canais que conduz, irredutivelmente, ao sono.

Apesar das obscuras e questionáveis armações políticas que estavam envolvidas no evento, como o apoio financeiro massivo e desnecessário da Prefeitura carioca na produção, o Rock in Rio é uma chance para uma multidão de vivenciar, de pôr os pés no chão e os ouvidos nas ondas sonoras de grandes artistas que influenciam o pensamento global. Estar sob o Palco Mundo naqueles momentos é uma oportunidade única para uma geração.

É inadmissível analisar o que acontece nos Estádios pela televisão. É impossível entender o que aconteceu ontem, durante a apresentação do Red Hot Chili Peppers, sentado na frente da TV. Apenas os torcedores de arquibancadas sabem o verdadeiro sentido do esporte. Somente aqueles que ouviram 'Around the World' de perto sabe o que significa o Rock para a cidade do Rio. Quem esteve lá saiu com a sensação de dever cumprido. Junto com os regenerados californianos, que após uma passagem fraca na edição de 2001 fizeram um show histórico, aqueles cem mil roqueiros molhados foram contagiados pela convicção de que a vida é bela ao redor do mundo.

Por Helcio Herbert Neto.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Olhar estrangeiro


Um fato me chamou a atenção nesta manhã. Passando o olho pelos blogs e pelos portais de notícias, descobri que o principal jornal da Argentina, "El Clarín", publicou ontem, em seu site, uma matéria detalhada sobre a joia brasileira em evidência, Leandro Damião.

Na matéria que pode ser lida aqui na íntegra, o periódico conta a trajetória do atacante e exalta a rapidez com que o "novo craque" mudou do anonimato dos campos de várzea para conquistar títulos e adquirir status de ídolo num clube grande, o Internacional. O jornal se mostra perplexo sobre como o atleta fez para, em tão pouco tempo, passar de "los partidos de 30 reales" (ele chegou a ganhar essa quantia por jogo, ainda em São Paulo) "a este Damiao que parece capaz de cualquier fantasía y de mil goles".

A matéria, por fim, se derrete ao lembrar a jogada mágica que certamente a motivou - a lambreta aplicada pelo atacante brasileiro em Emiliano Papa no confronto entre Brasil e Argentina pelo Superclássico das Américas, na última quarta-feira - e encerra com um depoimento humilde do jogador colorado sobre a sua ascensão no mercado mundial da bola.

É evidente que a rivalidade futebolística entre Brasil e Argentina fica só nos gramados e que os jornais de ambos os países destacam o que há de melhor no outro. Mas isso não ocorre com tanta frequência quanto deveria e acho interessante postar essa matéria, não só para parabenizar os hermanos e "El Clarín" como também para enaltecer o câmbio de informações. Quem não quer saber o que acham de nós?


Por Beto Passeri.

Forma e Conteúdo


De longe, na mira, a mais bela mulher da noite. Entre comentários de amigos e pessoas próximas, trata-se de uma unanimidade. Ela é a mais encantadora. Com os olhares e os artifícios do velho e conhecido método de abordagem, ela parece se aproximar. Sim, a mais desejada da noite decodificou os sinais e, de maneira também simbólica, ratificou seu interesse. Nessa hora, por efêmeros e, ao mesmo tempo, eternos instantes, é apresentado um horizonte esperançoso para aquela noite. Conhecer uma atraente e, à primeira vista, interessante garota parece ser a certeza do sucesso.

Sob a intorpecência da madrugada, tudo perfeito. Que ótima noite, constata ele, em meio às roupas jogadas na cama e ao travesseiro, sobreposto ao rosto. Com o sol da manhã ultrapassando as persianas, uma idéia lhe vem a cabeça. Reencontrá-la seria uma alternativa plausível de reviver os bons momentos já perdidos no tempo. Parece que para ela, o encontro pretérito também foi positivo. Após utilizar algum dos meios de comunicação, que não faltam nesses nossos dias, marcam de se encontrar.

Logo depois dos primeiros instantes, uma sensação desagradável toma o, como se pode dizer, casal. Não há mais a mesma sinergia. Aliás, a falta de proximidade entre ambos os mundos parece infinita. O tempo demora a passar, o barulho dos ponteiros do relógio tem o volume sonoro de uma sirene. Um suspiro e um alívio. Finalmente aquele mal-estar passa. Vão embora. Por educação, fica acordado um novo encontro que nunca irá acontecer. Ambos notam-se sós. Seduzidos por uma forma, repelidos por um conteúdo.

Fugindo da velha discussão acadêmica que acompanha, há séculos, a Filosofia. Trata-se de uma das mais evidentes dicotomias do planeta, por isso ela é comumente observada nos meios de comunicação. Basta sentar na frente da televisão e seguir processo incessante de passagem de canal em canal. O que mais te prende? O conteúdo apresentado ou o modo como ele se apresenta? A mensagem em si ou os aspectos do meio pelo qual ela passa até ser capturada por nós, os receptores?

Como um temeroso enamorado, certamente o que nos prende, inicialmente, é o desenho, em seu sentido mais subjetivo. Belas formas prendem a atenção de pessoas andando na rua e de espectadores de qualquer tipo de mídia. Isso explica o massivo investimento em profissionais de psicologia, especialistas em cognição humana. Explica também o crescente interesse dos estudantes de comunicação em áreas como a fotografia e o audiovisual. O mercado encaminha os futuros profissionais para o espetáculo.

No jornalismo esportivo isso também é evidente. A tática e a estrutura do jogo são esquecidas. O lado romântico e poético do jogo é posto de lado. As nuances políticas e econômicas que circundam confederações e clubes são abandonadas. Valoriza-se muito mais a eloquência, a aparência e a desenvoltura dos apresentadores no ar. O jornalismo se torna entretenimento, como um show de auditório dominical ou um videoclipe.

Como em um segundo encontro, ao analisar mais profundamente, percebemos a superficialidade dos assuntos tratados. Sempre os mesmos discursos, os mesmos conceitos, unanimidades. Belas unanimidades burras. A falta de visão questionadora que esse ambiente proporciona é nocivo àqueles que estão assistindo, que não têm sua visão crítica instigada, não exercitam sua habilidade de questionar. Porém, quem mais perde com isso é o próprio esporte. Sem discussões inteligentes, mantém-se inerte, à mercê dos dias e do tempo.

Nesse cenário apocalíptico, admiráveis são os pontos fora das curvas. Os jornalistas que conseguem expôr opiniões divergentes, discutir questões pertinentes e estimulantes. Admiráveis também são aqueles que atribuem ao meios, as formas pelas quais transmitem suas mensagens, sentidos que contribuem para essa visão crítica da sociedade. Por mais que escassos, os exemplos existem na programação e devem ser louvados. E prestigiados.

E quando há a identificação, mais difícil se torna o adeus. Seja entre o público e o programa, seja entre o casal de amantes. Por mais que magnetizados, nos primeiros segundos, pela forma, é o conteúdo que mantém, a cada instante, os dois mundos em contato. Sem essa identificação com essa essência do que está sendo apresentado, a audiência fica saturada das mesmices, das superficialidades e troca de canal. Um bom conteúdo facilita o estabelecimento de pontes entre idéias, que são muito mais concretas do que as estabelecidas por questões estéticas.


por Helcio Herbert Neto.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Série Marginalizados: O Radioativo


Em meados da década de 70, o mundo vivenciava o auge da Guerra Fria. Divididos entre o capitalismo norte-americano e o socialismo soviético, os países tomavam partido e rezavam à noite, na cama, pedindo o fim daquela angústia. O último golpe tinha sido forte: os EUA mandaram, em 69, Apollo 11 à Lua, e o mundo assistiu, atônito, aos passos de Neil Armstrong entrarem para a história. De lá, o astronauta pôde ver os soviéticos se encolherem no globo, fracassados.

Determinada a reagir, a URSS direciona suas forças e seu dinheiro para a “corrida armamentista” e abre, no norte da Ucrânia, a usina nuclear de Chernobyl. Dezesseis anos se passam, Irã, Iraque, Afeganistão e Vietnã viram o palco do horror, o cinema e Sylvester Stallone impulsionam os ideais estadunidenses e, quando Gorbachev assume, os socialistas já não tem forças para dominar o planeta.

Na madrugada gelada de 26 de abril de 1986, um reator apresenta problemas naquela, então inútil, usina de Chernobyl. Uma nuvem quatrocentas vezes mais radioativa do que a bomba atômica que dizimou Hiroshima avança, incontrolável, pelo leste europeu. O caos toma conta de parte do Velho Continente e multidões deixam suas casas sem tempo para fazer as malas.

Na pequena vila de Dvirkivschyna, pessoas fogem desesperadas e, entre elas, um menino de nove anos corre com os pais sem saber para onde e nem por quê. Nas mãos, uma bola de futebol murcha era o que confortava o pequeno Andriy Shevchenko em meio àquele terror.

Nove anos após o desastre, Shevchenko não estava perto de esquecer o trauma, mas levava sua vida bem e estreava na equipe profissional do Dínamo Kiev como uma das maiores promessas do país. Cada vez mais lapidada, a joia tornou-se uma realidade ao classificar o time ucraniano para as semifinais da Liga dos Campeões contra o campeão Real Madrid, marcando três gols nos dois confrontos. A equipe não foi campeã, mas o caminho do atacante não podia ser outro que não um gigante europeu. E assim Shev se foi para o Milan, sedento por novas conquistas.

Gol após gol, o ucraniano parecia afetado pela radiação de Chernobyl, como um x-man da bola. Nenhum zagueiro o marcava bem e nenhum goleiro parava suas bombas. Em sete temporadas, ganhou cinco títulos, incluindo a Liga dos Campeões; marcou 173 gols em 296 jogos e levou o prêmio Bola de Ouro, em 2004.

Nem só de Pelés e Romários se faz o mundo da bola, e Shev chegou ao seu limite. Dali em diante, seriam só passagens apagadas pelo Chelsea e pelo próprio Milan, mas que não borraram a história desse jogador extraordinário. Farto da competitividade e dos estrelismos nos grandes clubes europeus, Andriy, como todo bom filho, voltou ao Dínamo para ser idolatrado pelos fãs conterrâneos e está lá desde 2009.

Seu futebol técnico e explosivo o fez o maior jogador da história de seu país. Sem muita tradição, a seleção da Ucrânia se classificou para sua primeira Copa do Mundo em 2006, graças ao eterno 7. Não foi uma Copa brilhante, é verdade, mas Shev só caiu com seus compatriotas nas quartas-de-final e, assim mesmo, para a futura campeã Itália.

Recentemente, anunciou sua aposentadoria: vai parar depois da Eurocopa 2012, justamente na Ucrânia. Às vezes, a história apronta umas coisas engraçadas e que nos fascina. Quem sabe o menino que fugiu, apavorado, da radiação há 25 anos não nos brinda ano que vem, seguro, conduzindo seu país a algum feito memorável.


Por Beto Passeri.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Um Brado Retumbante



Um feriado frio. O velho sofá rasgado. Mais um Pré-Olímpico de Basquete Masculino. Descrente, lá vou eu apoiar aqueles jogadores, aquelas mesmas figuras que marcaram esse hiato de títulos, esse período em que o Brasil ficou fora de Olimpíadas e longe de boas posições em Campeonatos Mundiais. Por coincidência, foi exatamente nesses tempos de seca que eu me tornei fã do esporte da bola laranja, o que me torna um sofredor convicto.


Um jogo contra a Argentina em Mar del Plata. Sim, a Seleção da Década. Do Mestre Ginobili, que foi uma das pedras fundamentais na colocação da cidade de San Antonio no mapa das grandes equipes da Liga Americana de Basquete. De Scola, com presença inconfundível no garrafão, que gera tremedeiras em marcadores ao redor do mundo. De Oberto, Delfino, Prigioni, Nocioni. Um cenário perfeito para a inércia: mais uma derrota brasileira e a continuação de meu sofrimento, tudo indicava.

E foi só olhar para a feição dos jogadores para que as previsões ficassem mais sólidas. Ao notar mais uma derrota de Tiago Splitter na bola ao alto, ao perceber a seriedade do Alex, o silêncio de Marcelinho Huertas, vi que seria mais um daqueles sofridos jogos de Pré-Olímpico. O sonho de uma vaga em Londres 2012 ficava mais longe, bastava fotografar aquela seleção para constatar.

Um barulho ensurdecedor vinha da torcida. Os argentinos também pensavam como eu. A vitória era certa para aquele time imbatível. O primeiro quarto foi equilibrado, como sempre. Era rotina: começo do jogo, a Seleção Verde e Amarela endurecia, dava pinta de vitoriosa. Mas, ao final, era sempre o mesmo penar. Foi quando notei que não havia nenhum tom de amarelo em jogo.

A Camiseta usada pelos brasileiros era branca. Sim amigos, acredito que para muitos passou despercebido. Não é de agora. Lembro-me bem de que no Mundial do ano passado a seleção já usava a cor branca. Entendi também que toda aquela introspecção da imagem dos jogadores era um reflexo da maturidade daquele grupo já cheio de cicatrizes. Não havia nenhum tipo de temor, de medo. A mudança de uniforme conspira tradicionalmente para uma mudança de espírito de uma equipe.

Depois da derrota para o Uruguai na final da Copa de 50, a seleção brasileira de futebol resolveu mudar de uniforme. Tornou-se a Seleção Canarinho, utilizando a cor amarela na vestimenta de seus atletas. A velha camisa branca ficou aposentada. A partir de então, vieram as vitórias e a História vitoriosa e Pentacampeã que todo mundo conhece.

Enquanto pensava nisso, os minutos foram passando. O Brasil seguia com brio, com gana, sempre próximo da vitória. Quando olhava para o placar, estava tudo muito parelho. Contudo, ao observar a partida, já era sensível a diferença entre as duas equipes. Os astros argentinos foram surpreendidos pela vontade de vencer que aquela equipe que vestia branco trazia no peito. Uma defesa sólida e um banco de reservas com jogadores muito valiosos estremeceram os campeões olímpicos de 2004.

Entretanto, mesmo estremecidos eles são fortes. O jogo foi levado até os últimos instantes. A dificuldade imposta pelo anfitriões gerou uma atmosfera única, um aspecto de decisão para aquele jogo que não passava de mais uma classificatória para as semifinais que definirão que vai para as próximas olimpíadas. No dia da Proclamação da Independência do Brasil, uma partida para entrar na ontologia do esporte nacional.

No fim deu Brasil. Repito: O Brasil ganhou da Argentina. Acabou o jogo. Não consegui entender, não acreditei. Foi quando vi Marcelinho Machado, 36 anos. Em Pré-Olímpicos desde 1999, só teve infelicidades. Ele sorria. Sem aquelas pernas bambas, sem a surpresa com o que estava acontecendo, eles já sabiam que era possível. Aquele momento era o alicerce do começo de um campanha olímpica.

Contudo, essa desconfiança que me marcou me fez aguardar a classificação. Após o Jogo da Independência, no sétimo dia de setembro, escrevi quase tudo isso que vocês já leram. Mas seria mais um fracasso, mais um engano? Aguardei o confronto contra a República Dominicana, o derradeiro confronto pela vaga.

Mais um grande jogo. Novamente vestidos sob os tons da alvos das letras da bandeira nacional, os brasileiros lideraram o jogo em todods os instantes. O adversário, com champanhes e cartas de congratulações nos vestiários, a aguardar a vitória, padeceu perante a frieza do basquetebol europeu dos tropicais. Um jogo coletivo, vistoso, rápido e moderno venceu a qualidade individual dos pivôs caribenhos.

Marcelinho Machado, craque da partida, arremessou a última bola sob lágrimas. O narrador gritou, era o fim. O encerramento de um período de trevas para um dos mais praticados esportes do país. Trevas que impuseram a ditadura de más administrações de cartolas, de esquecimento do basquete. O Brasil retorna aos Cinco Arcos áureos sem uma grande estrela, mas com uma constelação capaz de expurgar a sombra de dias ruins.

Acreditei. Lembrei dos dias que passei a torcer por esses rapazes, os pobres gigantes. Era a hora deles. A prova de que as condições não fazem o homem, de que nada está traçado. Não importa que a competição aconteça em terras inimigas, que os nossos grandes atletas não participem, que tenhamos uma burocrática, incompetente e corrupta confederação. Fazemos a História. E foi isso que aqueles 12 gigantes, sob a batuta de um argentino, fizeram nessa semana: escreveram um dos mais belos capítulos no Livro dos Mitos Desportivos Verde e Amarelo (e Branco).


por Helcio Herbert Neto.

sábado, 10 de setembro de 2011

Politicamente incorreto


Desculpem, mas que creio não estar bem preparado para o jornalismo vigente no mercado. É que, de tanto se falar em "ética jornalística" - um termo, por si só, contestável - a expressão contaminou a cabeça dos profissionais de tal maneira que chegamos ao ápice da "Era do Politicamente Correto".

Só o que consigo observar, e que é um tanto contraditório, é um distanciamento enorme entre a palavra do blogueiro, comentarista, etc, e a opinião dos C.C.I (Consumidores Compulsivos de Informação), ou seja, vocês (nós). A hipocrisia que o racicínio jornalístico impõe a si mesmo, essa censura de "pensamentos maus" leva a textos e discursos fracos, sem poder algum de convencimento e que acabam irritando a todos.

Trazendo, como sempre, a palavra para o futebol, vou falar de brigas em campo. Posso ser linchado em praça pública, mas não serei hipócrita: todo mundo gosta de ver uma confusão no futebol. Todo vascaíno foi à loucura quando o Pedrinho fez embaixadinhas contra o Flamengo, todo corinthiano teve um orgasmo com o malabarismo do Edilson contra o Palmeiras e ninguém ficou preocupado quando o circo pegou fogo depois. Pelo contrário, cada torcedor tomou as dores da sua equipe e cada empurrão pra lá foi motivo de comemoração.

É óbvio que tudo tem seu limite, que eu não sou a favor de polícia entrando em campo, pancadaria rolando solta em estádio de futebol. Mas quem já jogou bola (talvez venha daí a falta de tato de alguns profissionais) sabe que discussão acontece, provocação faz parte e o pau quebra de vez em quando, inevitavelmente. E o torcedor gosta de ver, como qualquer pedestre para pra apreciar um mínimo princípio de confusão na rua.

Mas estamos naquela Era, lembram-se? Nos vemos diante de um Flamengo e Corinthians que, por si só é um jogo quente, ainda por cima valendo "seis pontos" na briga pelo título Brasileiro. O estádio lotado, a torcida inflamada, a catimba rolando solta, jogadores se provocando ao pé do ouvido, o Flamengo em má fase, a cabeça a mil e, de repente, Gustavo dá um soco na barriga de Liédson. "A calamidade toma conta do futebol, o despreparo dos jogadores é muito grande, o telespectador não quer ver esse horror...".

Sejamos mais razoáveis. Não estou aqui para defender a atitude do Gustavo (que foi o que me motivou a escrever sobre o tema), nem para dizer que brigas são legais. Mas, certa vez, um professor de Antropologia me ensinou que qualquer fenômeno (rituais, costumes, etc) nos parece estranho se isolado de seu contexto histórico-cultural. Como pareceria estranho a um índio que batêssemos palmas diante de um bolo pegando fogo, se não explicássemos o que isso representa (e pensando por esse lado, quão patético é o Parabéns, não?).

Bom, o fato é que desde quinta venho lendo matérias e posts - como este do Sidney Garambone (que escreve coisas interessantes)- que me soam um pouco vazias, descontextualizadas. Assim como é descontextualizado o jogador ir ao STJD para ser julgado, tal qual um criminoso, podendo pegar doze jogos de punição. Se os árbitros viram, é expulsão; se não viram, é suspensão no próximo jogo, talvez nos próximos dois. Mas este teatro todo?

Um pouco mais de bom senso, um pouco mais de pelada nos fins de semana e muita gente vai começar a perceber que o futebol é mais humano do que qualquer outra coisa.


Por Beto Passeri.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Monogamia


Nossa geração não tem paciência para o amor. Na realidade, não tem para quase nada. Mas o amor, especificamente, me chama atenção. Prometo passar pelo futebol, mas não antes de fazer esta reflexão. Percebe como incomoda só o fato de você saber que falarei de amor?

Isso é esquisito. Você tem certeza que qualquer coisa que eu falar você já ouviu. Que não importa o tamanho do meu esforço, minhas palavras serão piegas e meu texto, clichê.

Isso acontece porque o amor se perdeu no tempo. Séculos e séculos de palavras iguais (ou não), mudando só a forma como eras dipostas. Românticas, parnasianas, modernas, familiares... Eis que o amor se encontra com uma geração que não tem saco para reflexões, nem tempo para sentimentalismo. Amar dá trabalho (o amor é uma atividade laboral?) e estressa sem "retorno". E falar de amor então? Não faz sentido, uma vez que temos tanto conteúdo pronto e podemos reproduzí-lo. Logo, o amor não é mais o amor. O amor é o que se fala (e falou-se muito) do amor, ou seja, é um mito.

É, o amor é o maior mito da sociedade pós-moderna (é assim que dizem?). Todo mundo acha que sente, que sabe falar sobre, mas ele está lá, abstrato, ultrapassado, cabisbaixo... Valores se distorceram, o relógio virou uma pistola de roleta russa engatilhada na nossa têmpora e estamos ansiosos. Nossa identidade é digital e perdemos os nossos sentidos. Condicionamos os olhos a não enxergar, o ouvido a não escutar e o tato a não sentir. Portanto, perdemos um pouco (leia-se muito) da nossa condição humana e não há nada mais difícil, hoje, do que falar "te amo".

Esta geração não está perdida, apenas nasceu acreditando nisso. Mas, de fato, não sabe amar. Ou sabe? Todo amor que não vejo nos lares e a paixão que não encontro em cartórios, absorvo nos estádios lotados ou nos bares em chamas num domingo de bola rolando.

O futebol não é, como muitos dizem, nosso maior amor. Deste ponto de vista, é o único. Não temos necessidade de falar sobre o fenômeno e contribuímos, assim, para que ele não se torne mítico, como a aliança de ouro num dedo anelar.


Por Beto Passeri.

É hora de ser diferente


Praticamente o que estava na minha cabeça pra ser escrito hoje, Rica Perrone passou para o seu blog oito horas antes. Logo, pego uma caroninha pela manhã enquanto preparo um novo post...

"Campeão de tudo, melhor técnico brasileiro para muitos, odiado por parte da imprensa e perseguido por qualquer coisa que diga ou faça, Luxemburgo tende a ser o para-raios rubro-negro, pra variar.

Sem muita grife, ainda provando que pode ser um dos tops, Tite é o alvo preferido e mais vulnerável dos alvi-negros. Qualquer clube olharia torto pra ambos neste momento. O que olhar diferente, talvez, faça a diferença que mereça o título.

Tite tentou fazer o que todos queriam e colocar Alex no time. Não funcionou.

Voltou. Não funcionou de novo.

Perdeu peças, o time desandou. Colocou o que tinha e, entre um erro ou outro, viu a queda brutal de rendimento coletivo e individual do líder do campeonato.

Ainda líder, é cobrado como se fosse um dos últimos.

Tite sofre com a fiel torcida, que é desconfiada e cobra o título como cobra uma obrigação.

Luxemburgo sofre com a imprensa, que toda oportunidade que tem joga nas costas dele todos os problemas do planeta terra.

Ele montou, sem defesa, um time competitivo.

Na principal competição, arrumou a defesa. Ela desfalca o time há rodadas e, novamente, o Flamengo sofre com os gols bobos.

Diferença brutal é que o ataque parou de resolver. E isso não se deve a uma mudança tática.

Se deve a queda absurda de rendimento de Leo Moura, Thiago Neves, entre alguns outros.

Se deve a falta de sorte com as contusões das únicas peças seguras de sua defesa: Alex Silva e Airton.

Se deve, também, a uma insistência com Deivid até outro dia justificável.

Hoje, não mais.

Deivid não poderia perder a posição pro mediocre Vanderlei.

Pode, talvez, pro esforçado Jael.

Num pacotão simples, Tite e Luxemburgo recebem cobrança de rebaixados quando na verdade fizeram, até aqui, junto com o Botafogo e o Vasco, as únicas campanhas que somam resultado a bom futebol.

São Paulo e Palmeiras enganam com seus resultados. Jogam abaixo, bem abaixo, de onde estão na tabela.

Cobrar do treinador é o natural. Jogar nas costas de quem pouco “inventou”, é burrice.

Tite e Luxemburgo fizeram ótimo trabalho e, sem maiores explicações táticas ou com posicionamentos improvisados, assistem a uma queda acentuada em alguns de seus jogadores.

O básico, mais fácil e menos sério é jogar nas costas deles.

O diferente será aquele que coloca o peso da queda em quem realmente caiu.

Luxemburgo não gritou menos. Nem mudou seus treinamentos. Tite não virou burro, nem faltou aos jogos do Corinthians.

Talvez seja uma ótima oportunidade de começarmos a mudar a mentalidade que tem criado mimados jogadores e deixado o futebol cada vez mais carente de craques de fato.

A queda é deles. A cobrança maior tem que ser neles.

Times de massa são cobrados por massas.

Massas não pensam.

Luxemburgo e Tite não são responsáveis por mudanças significativas em seus times que jusfiquem a queda brutal de rendimento de alguns jogadores.

Quando alguém aponta o céu, alguns olham a lua, outros olham o dedo.

Decida.
abs,
RicaPerrone "


Por Beto Passeri.