sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Lacuna em decibéis

(Alexandre Vidal/ Fla Imagem/ Divulgação) Volante Cáceres em mais uma partida vazia do Campeonato Carioca]


Depois do som, um lapso de silêncio. Seus ouvidos foram, até ali, marcados por toda sorte de ruídos, sons e estalos. Por tudo isso, estranhou a ausência de barulho que contaminou o quarto naquele começo de manhã dominical. Ao seu lado, um corpo inerte, estendido e abatido pela estafa da madrugada anterior. Tão raros quanto os decibéis naquele espaço de, quem sabe, apenas trinta metros quadrados, eram os pensamentos na cabeça dele. Era todo uma lacuna. E aquela falta o fez refletir sobre toda a trajetória até então, sobre o que achava bom, ruim e como lidou com todos os afetos. Não naquele instante, obviamente. Ali, era só silêncio.

'Quem cala consente', você já ouviu. Que grande besteira. A falta de manifestação, de fala ou de som pode ser tão ostensiva quanto a parde de som de um baile funk. O reflexo de seus rostos, dele e dela, sem os gritos banalizados e difundidos pela TV, o sorriso leve que rompeu-lhes a face, era muito mais simbólico que o berro incendiário de um protesto ao megafone. O resultado do impacto é pura dúvida. Talvez por isso difundiu-se tal expressão, por medo das consequências do silêncio e como forma de apologia ao falar.

Em vez do som de sempre, um ruído abafado. Estádio vazios, manchetes mornas, pouca gente vestida com a roupa do seu time e várias vozes falando. 'Os estaduais incentivam o futebol regional', 'O torcedor ainda é apaixonado', 'Os estaduais são os celeiros de grandes craques'. Por que não se calar? Tentar decodificar a ausência de gritos da torcida, a inexistência do bate-papo de esquina e o fracasso nas bilheterias não seria uma atitude mais inteligente do que tanto justificar?

As federações e, principalmente, a Confederação do Homem Biônico da Ditadura Marín insistem em campeonatos regionais cansativos. A explicação é lógica: os estaduais movem muito dinheiro e são as federações que ratificam a estrutura da CBF. Pregar a manutenção desse módulo de disputa é manter o status quo do futebol nacional e não dar espaço a dúvida, a inquietação e a intranquilidade da falta de barulho.

O silêncio me faz pensar. Se me questionarem qual é a melhor fórmula de disputa para os regionais, eu me calo e me ponho a levar em consideração todas as possibilidades. Como o amante na cama do motel, como o torcedor que se nega a gastar mais de cem reais em um programa futebolístico de família. Calo e não concordo; calo e creio que é por meio da ausência de manifestações que o sistema vai ruir, que vai mostrar por si suas falhas e conduzirá esses que esbravejam com a eloquência de tiranos líderes tribais ao silêncio derradeiro. O resultado trará as mudanças que o esporte nacional tanto precisa.


                                                                                                        
Por Helcio Herbert Neto.