Para ler o som de: Eclipse - Pink Floyd
O acesso aos compartimentos da memória pode ser uma tarefa
artística. Não há um inventário estatístico das experiências vividas. Tampouco
existe a possibilidade de revistar os momentos para uma análise técnica e
isenta. Ao recordar, os fatos são redescobertos, já ensaboados pelos afetos
que, de alguma maneira, têm relação com o instante pretérito.
São inúmeros os casos de recordações que escorregam nos
sentimentos envolvidos e desaparecem. Diante do avançado do tempo, é bem
verdade, as memórias acabam por apagadas por condições alheias aos ambientes
afetivos – condições médicas, por exemplo. As emoções, entretanto, também
renegam fatos ao obscuro do inconsciente.
Há até mesmo lembranças de um passado recente que são
alteradas pela raiva, paixão, descontentamento ou simples negligência que
circunscreviam tal episódio. Um lugar que parece mais belo e pessoas que são
lembradas como mais desagradáveis são exemplos da ineficácia do inventário da
memória.
Quem deslizou os olhos até este quarto parágrafo deve se
perguntar qual a relação de tudo isso com o esporte – que é o fio condutor do
que aparece nesta página escondida da internet. Já engajado em tratar da
abertura da Olimpíada de 2016, houve uma tentativa, de minha parte, de recordar como foi a cerimônia inicial dos Jogos Olímpicos de 2012.
Ao me imbuir de tal tarefa, fui abordado por um mecanismo da
memória que nem pertence à categoria das lembranças apagadas nem às recordações
repaginadas. Ainda tinha vivo na cabeça o exato instante em que a chama
olímpica foi acesa. Ao som de “Eclipse”, última faixa do disco “Dark Side of
the Moon”, do Pink Floyd.
Nada, em minha pueril imaginação, poderia ser mais
fantástico do que o supracitado desfecho musical. No entanto, ao pesquisar
imagens do evento na internet, terminei por me espantar: sim, é possível algo
mais marcante. Ao fim da música da banda londrina, Paul McCartney interpretou “The
End”, a também derradeira canção do álbum “Abbey Road”, dos Beatles.
Era a realidade se mostrando mais fantástica que os
registros da memória afetuosa. Ao mesmo tempo, foi uma cerimônia espetacular e
simbólica sobre a cultura britânica do século passado. Embora seja difícil
competir com a influência internacional da Inglaterra, opino: é possível
que o Brasil faça uma abertura também muito forte.
O reaparecimento de João Gilberto seria vertiginoso. Reuniões dos Mutantes, dos Doces Bárbaros ou dos sambistas que apareceram a
partir do Cacique de Ramos também seriam capazes de tanto. Bandas como Nação Zumbi
e Sepultura reúnem admiradores ao redor do mundo. Por motivos óbvios, a
presença dos Paralamas na abertura dos Jogos Paraolímpicos seria poderosa.
E esses são apenas alguns exemplos.
Por Helcio Herbert Neto.