terça-feira, 20 de agosto de 2013

É o “Ai, Jesus!”


Disse há algum tempo aqui mesmo que, se é verdade que o campeonato de pontos não mente, determinando como campeão o “melhor time”, é verdade também que torneios de mata-mata, como a Copa do Brasil, tampouco mintam. A questão é que esses campeonatos fazem perguntas diferentes, logo respondem de formas diferentes, e falar em verdade e ou mentira não faz sentido. O Brasileirão pede regularidade, consistência, peças de reposição, capacidade de concentração, competitividade, tudo em longo prazo. Difícil, dificílimo. Em geral, ganha o Brasileirão o time que consegue manter esses fatores em um nível razoavelmente equilibrado durante a maior parte do ano.

Por isso discute-se, por exemplo, se um Coritiba com o time bem armado, concentrado e com veteranos no comando pode se segurar no lombo do touro por muito tempo. Alex já se contundiu, Deivid também, o time segue fazendo partidas muito competitivas, mas começa a perder fôlego. No perde-e-ganha de cada rodada, começa a perder mais do que já perdeu outrora, e isso significa queda na pontuação no médio-longo prazo. Deve terminar na primeira metade da tabela, mas longe do campeão. Por outro lado, o Corinthians é citado toda semana como “um time que ainda não engrenou”. Não sei não. A verdade é que o Corinthians perdeu apenas duas em 15 rodadas e levou apenas seis gols. Seus jogadores se contundem ou são convocados para seleções nacionais e entram outros de nível parecido (Guerrero por Pato ou Sheik, por exemplo, ou Danilo por Douglas). Pode-se dizer que o time joga mal aqui e ali, que às vezes não encaixa o jogo, mas não se pode dizer, do Corinthians que Tite comanda há quase três anos, que o time jogou de sacanagem. Isso significa que, no louco emaranhado de expectativas revertidas do campeonato, você pega uma série de, digamos, cinco jogos do Corinthians e vê que o time ganhou uma ou duas, empatou uma ou duas e, se perdeu, foi no máximo uma partida. Um time que perde duas a cada quinze rodadas, em média, tende a acabar o campeonato com um aproveitamento no mínimo razoável. Mas aí você coloca a capacidade de substituição disponível no elenco, você pega o poder de mobilização da torcida corintiana e você pensa que, na hora em que o torneio começar a afunilar, que as vitórias começarem a ser efetivamente obrigatórias, a bola vai ficar mais quente e pesada, o gol vai ficar menor, todo goleiro adversário vai virar um gigante. E vê que, nessa hora, a tendência de um time como o Corinthians é ultrapassar seus adversários atuais. A uma competição que pergunta quem consegue ficar mais tempo em cima do lombo do touro, no futebol brasileiro de hoje, 20 de agosto de 2013, eu respondo: Corinthians. Mas essa não é a pergunta que a Copa do Brasil, que dá o pontapé inicial em suas oitavas de final hoje, com o Vasco visitando o Nacional-AM em Manaus, faz.

E é por isso que a edição deste ano promete tanto. Ao contrário de muitos anos anteriores, o futebol brasileiro felizmente voltará a ter seus maiores clubes se enfrentando em jogos realmente decisivos (vaga ou taça na beira do campo). Sou partidário do campeonato de pontos corridos, acho fundamental que essa seja a principal corda tocada pelo futebol nacional de um país ao longo de uma temporada, mas sou fã do mata-mata e sinto muita saudade de ver os grandes clubes do futebol brasileiro se mordendo. Cruzeiro e Flamengo, Santos e Grêmio, Botafogo e Atlético são os primeiros, mas muitos outros ainda vão acontecer. Levou tempo demais para a CBF entender que sacrificar os estaduais e a Sul-americana em nome desse tipo de competição é uma decisão óbvia. Ninguém quer ver jogo vazio na quarta à noite contra um Zé Ninguém da América do Sul, ninguém é trouxa mais de querer manter a tradição dos finados estaduais, que deveriam ser, no máximo, torneios de verão. Mas todo mundo quer assistir aos jogos dessa semana. Passeie pelos canais dos torcedores nas redes sociais e essa mobilização fica evidente.

Apesar da modernização do futebol nacional, da arenização dos nossos estádios e outras falcatruas, essa temporada está meio retrô. Galo e Botafogo são os times do ano, jogando futebol brasileiro (apesar de, no caso do segundo, o comando ser de um surinamês-holandês), o Maracanã, mesmo tendo passado na clínica do Dr. Hollywood, está de volta, as torcidas têm intensificado a tendência de cantar mais o amor pelos clubes que gritos de guerra contra outras torcidas, contra a PM, contra o lateral ou o volante bisonho que eventualmente habita o escrete de seus times. Tendência, aliás, que já vem de algum tempo. Essa Copa do Brasil é a chance de fechar o ano retrô do jeito mais clássico possível: com um monte de decisões emocionantes entre os clubes mais importantes do país (menos o São Paulo que, em função do título do ano passado, ficou preso à Sul-americana).

Tem arte, tem manha, tem sobrenatural, tem foguete (ops, isso não tem), bandeiras e arquibancada. Tem cancha cheia, tem zebra, tem de tudo. Dificuldade alguma se compara à dificuldade de levar um Brasileirão de pontos corridos, mas algo me diz que o título da Copa do Brasil 2013 vai ser quase tão gostoso quanto isso. É a primeira vez, desde que me entendo por gente, que o futebol brasileiro vai fazer as duas perguntas na mesma temporada: “quem consegue ficar mais tempo no lombo do touro?” e “quem tem a manha de levar um mata-mata encruado entre todos os grandes do país?”. A primeira ainda é possível responder sem parecer lunático e eu já apostei no Timão. A segunda resposta, só se for nos búzios ou no tarô. Faltam oito jogos apenas para o seu time ganhar um dos títulos mais alucinantes que o futebol brasileiro pôs em jogo nos últimos anos. Ai, jisus!

Por Bruno Passeri.


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