Quase sempre que falamos de passado fica a impressão de que
estamos nos referindo a um tempo áureo, melhor que o atual e que jamais
voltará. A terceira premissa certamente é verdadeira; as outras duas são discutíveis,
mas eu, guiado pelo meu pessimismo com o futuro, tendo a acreditar que não são
falaciosas como um todo. De qualquer forma, não é o passado em si que me
interessa agora. É o não-passado, o ‘falso passado’, ou seja lá como você
queira chamar.
A definição de passado é tudo aquilo que já passou. E a
definição, tão simples, é muito genial. Isso porque é exatamente assim que deveria
funcionar, mas não funciona. Pois não interessa o quanto o relógio ou calendário
nos direcione, só nos encontraremos através sentimento de pertencimento daquele tempo
e espaço.
Ou seja, se em 100 anos nada acontecesse no mundo além do passar dos
dias e das noites, nós não consideraríamos esse período como passado. Por outro
lado, se em 60 segundos toda a história da humanidade mudasse, esse minuto
seria um marco e dividiria dois tempos bem distintos, tal qual foi o milésimo
de segundo em que a primeira partícula do Big Bang explodiu. O que me separa da
Independência do Brasil não são 190 anos, mas o fato de eu não conseguir me imaginar em tal conjuntura.
O que me distancia das minhas primeiras festas de aniversário não são esses anos de
vida gastos até aqui, mas a memória embaçada, destorcida, quase bêbada daquele tempo.
Claro que essas são comparações extremistas – e a graça é
essa -, mas é inegável que estamos condicionados ao tic-tac do relógio, que “pensa”
por nós, evitando uma confrontação com nossas próprias vivências. Vamos ao
ponto: 2006. Não parece tão distante assim, né? (Agora mesmo, numa fração de
segundos, você recorreu a um ponto de referência - seis anos atrás – não foi?).
Claro que todo mundo irá se surpreender relembrando detalhes de seis anos
atrás, como era a vida pessoal, amorosa, o trabalho, etc, mas uns se espantarão
mais e outros nem tanto. Para alguns, seis anos significa metade, um terço da
vida; para outros, um piscar de olhos. Essa discrepância do relativismo de
idades e também a intensidade das mudanças me leva a buscar um ponto comum, que
é o motivo pelo qual este texto está neste blog: o futebol.
Todo esse pensamento me ocorreu assistindo à final da
Eurocopa, quando os comentaristas falavam sobre a formação dessa atual seleção
da Espanha. 2008, na outra Eurocopa. Mas eu precisei buscar um ponto de
referência ainda mais forte e acabei me detendo na Copa do Mundo de 2006.
Você ainda tem a(o) mesma(o) namorada(o) ou marido/esposa
que tinha em 2006? Pois o Brasil era inquestionavelmente a melhor seleção do
mundo, referência do futebol arte, e a Espanha...ninguém levava a Espanha a
sério. Você tem o mesmo emprego? Porque Ronaldinho Gaúcho era o atual melhor
jogador do mundo. Hoje ele está no Atlético Mineiro, que àquela época disputava
a Série B do Campeonato Brasileiro. Você ainda mora na mesma casa? Pois fique
sabendo que Seedorf, um dos craques do Milan campeão da Liga dos Campeões no
ano seguinte, acaba de fechar com o Botafogo do Rio de Janeiro, que em 2006
comemorava um estadual depois de seis anos sem levantar um troféu.
Você não mudou muito desde 2006? Mas Iniesta, eleito melhor
jogador desta Eurocopa e autor do gol do único título Mundial da Espanha, era
reserva na seleção e no Barcelona. Messi, três vezes melhor do mundo e já um
dos maiores jogadores da história do futebol, também.
Você se aposentou nesse tempo? Ronaldo, Zidane e Romário
também. O último, inclusive, chegou ao milésimo gol. Você se formou no colégio
ou na faculdade de 2006 para cá? Neymar, que tinha 14 anos, se formou no
Santos. Entrou nos profissionais, ganhou um tricampeonato Paulista, uma Copa do
Brasil e uma Libertadores que não vinha desde Pelé.
Faz tanto tempo assim, é? Faz. Faz porque a diferença entre
um minuto, uma hora e uma vida não é o que acontece, é o que a gente sente.
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